Com frota reduzida, Lafaiete pode ficar sem ônibus

Com frota reduzida, Lafaiete pode ficar sem ônibus

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Imagine uma cidade com quase 130 mil habitantes, listada como o 22º município mais populoso de Minas, amanhecer sem ônibus? É o que pode acontecer neste mês em Conselheiro Lafaiete, na região Central do Estado. É que a concessão da Viação Presidente – responsável pelo serviço – termina neste mês, e um novo processo licitatório nem sequer começou.

A população que depende do transporte coletivo para chegar ao local de trabalho está preocupada com a notícia. E, para piorar a situação, o serviço anda precário há muito tempo. Desde o início da pandemia, o número de ônibus em circulação passou de 34 para 15 – uma redução de 56%.

“Preciso trabalhar e necessito do transporte. Sem ele fica difícil. Não dá para depender de carona. A gasolina também está cada vez mais cara”, desabafou a autônoma Daiane Caroline, 25. Ela foi entrevistada na manhã da última terça-feira, quando a equipe de O TEMPO foi à cidade para acompanhar o caos do transporte coletivo. Daiane usa dois ônibus para chegar ao local de trabalho e gasta quatro horas nas viagens de ida e volta. É o mesmo caso da funcionária pública Marilene da Silva, 49. “Moro muito longe, e ficar sem ônibus vai ser difícil”, disse.

Sucateamento

Durante três horas, a reportagem presenciou cenas que demonstram a situação precária dos coletivos na cidade. Mesmo com a retomada do comércio no município, o número de ônibus disponíveis para a população não voltou ao patamar anterior à Covid-19. O resultado são grandes filas e longa espera – que pode chegar a cinco horas, conforme relatos.

Além disso, as recomendações das autoridades de saúde para conter o novo coronavírus são desrespeitadas. Vários usuários precisam se espremer nas plataformas do terminal rodoviário para ter acesso aos ônibus. Dentro do veículo, a situação não muda. “Mesmo sabendo que estou me arriscando, preciso pegar o ônibus para tratar os doentes”, revelou a técnica em enfermagem Laila Torres, 36.

Para piorar, os usuários ainda precisam viajar em veículos velhos, que não passam por manutenção. Não é raro que os ônibus estraguem no meio do trajeto. Segurança, então, não existe. A reportagem, inclusive, presenciou ao menos quatro veículos estragados, que precisaram passar por reparos antes de seguir viagem.

“Eu tenho medo de andar nesses ônibus, só ando porque preciso. É raro uma viagem que o ônibus não estraga, e o motorista tem que consertar pra viagem continuar. Já andei num ônibus que soltou o volante, e o veículo quase se chocou contra um muro”, finalizou a auxiliar de serviços gerais Silvania Aparecida, 49.

Prefeito pode ser processado

A legislação determina que a administração pública ofereça serviços essenciais para a população. O transporte público, conforme especialista ouvido pelo jornal O TEMPO, está na citada lista. Caso o prefeito Mário Marcus (DEM) não tome uma atitude para que a população não fique desassistida, ele pode responder por improbidade administrativa e até perder os direitos políticos.

“Transporte público se trata de um serviço essencial. Se o fornecimento for cessado, o prefeito pode responder criminalmente”, explicou o advogado e professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Lucas Neves.

A prefeitura da cidade informou, por meio de nota, que o contrato com a Viação Presidente não foi aditivado (prolongado) e não será renovado. A administração pretende adotar medidas paliativas antes que um novo processo licitatório ocorra. No entanto, essas alternativas não foram detalhadas no texto. A prefeitura abriu um processo de contratação emergencial, mas, até o fechamento desta edição, nenhuma empresa havia feito adesão à proposta.

Processo demorado. O cenário fica mais desanimador por causa do tempo necessário para se realizar uma licitação. Neves informou que um trâmite desse tipo pode se estender por, pelo menos, seis meses. O advogado enfatiza ainda que o serviço, em hipótese alguma, pode ser interrompido. Para resolver o problema de forma mais ágil, o especialista sugere que o processo licitatório contemple veículos de diferentes e capacidades de lotação, como vans e micro-ônibus.

Punição. Para que o prefeito seja punido, caso os ônibus parem de rodar, é preciso que haja uma denúncia no Ministério Público de Minas Gerais ou na Câmara Municipal de Conselheiro Lafaiete. Os dois órgãos informaram que, até o fechamento desta matéria, não havia nenhuma reclamação com relação ao caos do transporte público do município da região Central de Minas.

“Se o município parar de ofertar o serviço, o cidadão pode entrar em contato com o MPMG para formalizar uma denúncia. O órgão pode obrigar a administração pública a voltar a ofertar serviço imediatamente”, complementou.

A reportagem marcou entrevista presencial com o prefeito Mário Marcus (DEM). Ele atenderia O TEMPO na terça-feira, porém ele desmarcou, e a prefeitura enviou a nota.

A equipe também marcou entrevista presencialmente com o diretor da Viação Presidente, responsável pelo serviço na cidade, mas ele cancelou o encontro e não deu retorno por telefone ou e-mail.

Lotação vira caso de saúde pública

Para além dos transtornos diários de viajar em ônibus lotados, o sucateamento do transporte coletivo de Conselheiro Lafaiete virou um caso de saúde pública. O infectologista Leandro Curi lembra que o distanciamento social é uma das medidas de prevenção contra o coronavírus. Na cidade, 5.286 pessoas já contraíram o vírus, das quais 54 morreram, segundo a Secretaria Municipal de Saúde.

Com os veículos levando mais pessoas do que a lotação aconselhada, é difícil se livrar da aglomeração. Mesmo assim, o médico aconselha o uso da máscara durante todo o trajeto. “Infelizmente, o ônibus cheio é um dos lugares mais propícios para se pegar a Covid-19, mas quem se cuida tem menos chance”, explicou o médico.

A faxineira Normalena de Melo, 61, se previne como pode. “Só ando de máscara, quando entro no ônibus, passo álcool nas mãos, quando dá passo no assento e fico perto da janela”, disse.

Falta de coletivo pode travar economia da Lafaiete

Entre os 15 entrevistados pelo jornal O TEMPO em Conselheiro Lafaiete, que aguardavam o ônibus para chegar até o local de trabalho, estavam lojistas, autônomos, funcionários públicos e auxiliares de limpeza. Se a interrupção do transporte se concretizar, a situação pode causar prejuízos para a economia da região.

A Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Conselheiro Lafaiete já está preocupada. “Muitos dos comerciários de Conselheiro Lafaiete dependem do transporte público para deslocamento, os bairros mais afastados da região central acabam sendo os mais prejudicados com a diminuição”, ponderou o presidente da CDL Lafaiete, Aloísio Rezende.

Para Rezende, é preciso pensar em alternativas. “Devemos estudar formas para que o nosso comércio não seja afetado com a diminuição. O transporte efetivo é de suma importância para o desenvolvimento da cidade”, concluiu.

Interligar meios é alternativa

A baixa oferta de ônibus aliada à demora para o início de uma nova licitação relacionada ao transporte público em Conselheiro Lafaiete, na região Central, sinaliza a falta de investimento e de atenção ao setor de mobilidade urbana, que passa por constantes transformações e modernização. A conclusão é do engenheiro civil e mestre em transportes, Silvestre de Andrade.

O especialista compara Lafaiete a Barbacena, no Campo das Vertentes. As duas cidades têm densidades populacionais parecidas, ambas com cerca de 130 mil habitantes.

No entanto, Barbacena investiu em um transporte integrado. Assim, os moradores podem fazer parte do trajeto de bicicleta e o restante de ônibus, por exemplo. “Hoje em dia é de extrema valia que os gestores pensem em investir em diferentes meios de locomoção, como ciclovias. A bicicleta é um meio de transporte barato e eficiente para viagens curtas, o que pode desafogar o transporte público”, explicou.

Investimento

No entanto, a solução para uma mobilidade inteligente exige investimento, segundo Andrade. A bicicleta, conforme o especialista, só é eficiente e segura se existir investimento adequado das cidades em ciclovias e cliclofaixas.

A interligação dos meios, se bem estruturada, pode criar uma rede que, além de reduzir a superlotação, dá mais conforto e agilidade ao usuário. “É válido mesclar os meios de locomoção. Criar ciclovias perto de terminais rodoviários e instalar estacionamentos para bicicletas nesses terminais. O usuário pode fazer o uso de dois meios e evitar superlotação”, sugeriu.

Fonte: Jornal O Tempo


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Este post tem um comentário

  1. Edina Moura Pereira

    Vamos colocar os transporte escolares que estão parados pra trabalhar

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